“NÃO TEMOS MEDO DAS RUÍNAS”: DECLARAÇÃO DE TÊKOŞÎNA ANARŞÎST SOBRE ATUAL SITUAÇÃO EM ROJAVA

Desde 2020, a guerra civil na Síria não sofreu grandes desdobramentos. Com a Rússia, maior aliada do regime sírio, ocupada com a invasão da Ucrânia, e o Irã distraído com as agressões de Israel em Gaza e no Líbano, as forças jihadistas, como o grupo Hayat Tahrir al-Sham (HTS), tomaram Aleppo, cidade mais importante no norte da Síria, desafiando o poder do ditador Bashar al-Assad e impondo nova ameaça à luta por liberdade e a revolução social em Rojava. Em em meio a esses eventos, o grupo Tekoşîna Anarşîst (Luta Anarquista/TA), atuando em Rojava há pelo menos 5 anos, lançou um comunicado sobre a situação e sua posição diante dos novos desdobramentos da guerra civil síria.

entrevistamos companheiros do TA em 2020 e traduzimos uma outra entrevista feita pela da federação Anarquista uruguaia (fAu) aqui em nosso blog. Convidamos a todas as pessoas interessadas na superação do capitalismo, do fascismo, do patriarcado e do colonialismo a conhecer o processo revolucionário em Rojava e a contribuição de anarquistas em solo para essas lutas. A tradução do artigo abaixo foi feita pela editora Terra Sem Amos.


“NÃO TEMOS MEDO DAS RUÍNAS”

Há mais de cinco anos, as Forças Democráticas Sírias (SDF) puseram fim ao califado do Estado Islâmico (ISIS). Agora, com a nova ofensiva do Hayat Tahrir al-Sham (HTS), corremos o risco de reviver suas atrocidades. O HTS uniu diversos grupos jihadistas, incluindo ex-combatentes do califado em suas fileiras. Recentemente, eles iniciaram uma grande ofensiva, rompendo o cerco de Idlib e provocando o colapso do Exército Árabe Sírio (SAA). Aleppo foi a primeira grande cidade capturada, com a apreensão de grandes quantidades de armamento avançado deixado para trás por soldados do regime.

As SDF reagiram rapidamente, enviando reforços para proteger o bairro curdo de Sheh Maqsoud, em Aleppo, bem como os campos de refugiados na região de Sheba. No entanto, as forças que representam o exército turco, o Exército Nacional Sírio (SNA), iniciaram uma nova ofensiva coordenada com o HTS, invadindo essa mesma região de Sheba. Os refugiados deslocados pela invasão turca de Afrin em 2018 são, mais uma vez, forçados a abandonar seus lares sob a mira de armas. Mais de 100.000 pessoas agora buscam abrigo em tendas improvisadas às margens do rio Eufrates, ainda ameaçadas por novos avanços de grupos jihadistas.

Esses novos desdobramentos agravam a instabilidade no Oriente Médio e devem ser analisados em conjunto com outros conflitos em curso na região. A ocupação israelense de Gaza, juntamente com os ataques contra o Hezbollah, enfraqueceram a posição do Irã na Síria, limitando sua capacidade de apoiar o SAA. Tropas russas, também enfraquecidas após quase três anos de guerra na Ucrânia, abandonaram várias posições terrestres e estão bombardeando brutalmente Idlib e Aleppo. Os Estados Unidos tentam se manter fora do conflito, sabendo que Trump pode pressionar pela retirada de suas tropas do território sírio. Os soldados turcos ainda não estão abertamente envolvidos, mas o Estado turco está mexendo os pausinhos do SNA para continuar suas políticas genocidas contra o povo curdo. Assad está tentando obter apoio internacional de outros países árabes, e o Irã já começou a enviar reforços para uma contraofensiva conjunta com o SAA. Em meio a esse caos, a Revolução de Rojava e o Movimento de Libertação Curdo resistem como a principal esperança para revolucionários no Oriente Médio.

A maior movimentação de forças na Síria nos últimos cinco anos está em curso e pode ter implicações que ainda não conseguimos prever. É uma situação complexa, e vemos como muitos jornalistas têm dificuldade em compreendê-la. Grande parte da mídia ocidental tem sido complacente com o avanço do HTS, chegando até a chamá-los de oposição revolucionária, “rebeldes” contra a ditadura de Assad. Também desejamos a queda do regime, mas o HTS e seu “governo de salvação” não são uma solução libertadora. Seu objetivo é substituir a dinastia Assad por leis da sharia e um estado islâmico, pouco diferente do que o Talibã está fazendo no Afeganistão ou do que a República Islâmica do Irã tem feito desde 1979. Esse não é um futuro que podemos aceitar, e muitos sírios também não aceitarão.

Nós, como anarquistas e internacionalistas em Rojava, desempenharemos nosso papel nesses tempos desafiadores. Lutaremos ao lado das SDF para defender e expandir o projeto revolucionário, construindo uma sociedade sem Estado onde prevaleçam os princípios do confederalismo democrático, pluralismo e da revolução das mulheres. Conclamamos todas as forças anarquistas e outros movimentos revolucionários, agora mais do que nunca, a defender Rojava!

Sabemos que a guerra traz sofrimento e destruição, mas também pode abrir oportunidades para uma vida livre para aqueles que estão prontos. Vimos o que a vitória sobre o ISIS nos possibilitou e estamos prontos para continuar lutando por um futuro melhor. Porque não temos medo de ruínas!

Muitos camaradas estão perguntando: O que posso fazer para apoiar a revolução?
  • Viajar para o Nordeste da Síria (NES) não é possível no momento, pois as fronteiras estão fechadas. Mas você pode garantir que o que está acontecendo na Síria seja conhecido, escrevendo artigos, realizando entrevistas, podcasts, organizando palestras e eventos em coordenação com comitês de solidariedade já existentes.
  • Se houver manifestações de solidariedade em sua região, participe e apoie! Se não houver, talvez você possa organizá-las!
  • Você também pode fornecer apoio econômico aos mais necessitados, já que a crise humanitária atual é crítica e requer nossa atenção. Para isso, a Heyva Sor, uma organização independente, já está trabalhando para apoiar e prover assistência aos afetados pela guerra no nordeste da Síria.

Isto está longe de acabar. Mantenha-se informado e prepare-se para os próximos acontecimentos!


PARA SABER MAIS:

Deixe um comentário